
A alergia à proteína do leite de vaca (APLV) é uma das reações alimentares mais frequentes na infância, principalmente no primeiro ano de vida. Porém, por provocar sintomas inespecíficos, semelhantes aos de outras condições infantis, como cólicas e refluxo, muitas vezes é confundida com a intolerância à lactose ou até subestimada pelos adultos cuidadores.
De acordo com dados do Ministério da Saúde, pediatras gastroenterologistas brasileiros identificaram a prevalência de 5,4% de APLV em crianças no país. Segundo o Dr. Júlio Cezar Boaventura, médico da área de pediatria do AmorSaúde, rede de clínicas parceiras do Cartão de TODOS, saber identificar corretamente os sinais e entender as diferenças entre as condições é essencial para garantir o bem-estar da criança.
APLV ou intolerância à lactose
Conforme o Dr. Júlio Cezar Boaventura, é normal que haja confusão entre os diagnósticos, uma vez que os sintomas podem ser inespecíficos e inerentes a outros diagnósticos diferenciais, como a intolerância à lactose, mas também com a doença celíaca, as doenças inflamatórias intestinais, a estenose pilórica, a doença de Hirschsprung e outras.
Embora muitas vezes confundidas, essas condições são distintas em suas causas e efeitos. A APLV é uma resposta do sistema imunológico às proteínas do leite de vaca, principalmente à caseína (proteína do coalho) e às proteínas do soro do leite (alfa-lactoalbumina e betalactoglobulina), e pode provocar reações severas mesmo com pequenas quantidades do alimento.
A intolerância à lactose, por outro lado, é uma deficiência da enzima lactase, que dificulta a digestão do açúcar presente no leite, gerando sintomas gastrointestinais como gases e distensão abdominal. “Enquanto a intolerância é mais comum em crianças maiores e adultos, a APLV costuma surgir ainda nos primeiros meses de vida e exige uma abordagem completamente diferente”, explica o médico.
Sintomas da APLV
Segundo o Dr. Júlio Cezar Boaventura, os sinais da APLV podem aparecer logo após o consumo do leite ou demorar algumas horas para se manifestar. Entre os principais sintomas, estão diarreia persistente (às vezes com sangue), vômitos frequentes, cólicas intensas, dermatite, refluxo severo e dificuldade de ganho de peso.
O médico ainda alerta que a presença de múltiplos sintomas ou a persistência deles — mesmo com os cuidados básicos — são fortes indicativos da necessidade de investigação. “Se os pais percebem que o bebê está com desconfortos recorrentes ou que não está se desenvolvendo como o esperado, o ideal é buscar imediatamente avaliação médica”.
Diferenciando APLV de cólicas
O profissional explica que a cólica é comum nos primeiros meses de vida e tende a desaparecer com o tempo, geralmente por volta do terceiro mês. A diferença está na intensidade e persistência dos sintomas. Isso porque a APLV costuma vir acompanhada de outros sinais, como sangue nas fezes, refluxo exacerbado e irritabilidade contínua, o que ajuda a distinguir ambas as condições.

Importância do aleitamento materno
Segundo o Ministério da Saúde, a amamentação pode oferecer um efeito protetor ao bebê, já que a quantidade de proteína do leite de vaca que chega ao leite materno, proveniente da dieta da mãe, é cerca de 100 mil vezes menor do que a presente no próprio leite animal.
Por isso, a APLV tende a ser menos frequente em lactentes alimentados exclusivamente com leite materno, embora ainda haja possibilidade de ocorrer, com incidência estimada em até 0,5%. Quando a alergia se manifesta nesse grupo, os sintomas costumam ser mais leves do que nos bebês alimentados com fórmulas infantis.
Diagnóstico e tratamento da APLV
O diagnóstico da APLV é majoritariamente clínico, baseado na história do bebê, nos sintomas apresentados e na exclusão de outras causas. Em alguns casos, testes alérgicos ou exames laboratoriais podem ser solicitados, mas nem sempre são determinantes.
O tratamento baseia-se na dieta com exclusão completa do leite de vaca e seus derivados da alimentação da criança. Com a retirada, os sintomas tendem a desaparecer em poucos dias. “Esse processo precisa ser acompanhado de perto por um pediatra ou alergista, que avaliará a evolução do quadro e orientará a reintrodução futura, se for o caso”, afirma o médico.
Cuidados com a alimentação da mãe
O Dr. Júlio Cezar Boaventura afirma que quando o bebê está em aleitamento materno exclusivo, a dieta da mãe também precisa ser adaptada. “É necessário eliminar completamente todos os alimentos que contenham leite ou traços da proteína, já que esses compostos podem ser transferidos ao bebê pelo leite materno”, explica.
O médico alerta ser “válido se atentar aos rótulos dos alimentos e produtos, onde a presença de leite de vaca pode ser indicada principalmente pelas seguintes nomenclaturas: caseína, caseinatos, lactoglobulina, lactoferrina ou soro/whey”.
Para os bebês que utilizam fórmulas, existem alternativas seguras no mercado, como as fórmulas extensamente hidrolisadas e à base de aminoácidos, que não provocam reação alérgica. Segundo o médico, fórmulas à base de soja só devem ser utilizadas com indicação médica e, geralmente, não são recomendadas para crianças menores de seis meses.
Cura da APLV
Dados do Ministério da Saúde indicam que cerca de 65 a 75% dos casos de APLV tendem a ser solucionados até a criança completar três ou quatro anos. No entanto, o órgão destaca que não há uma definição exata sobre por quanto tempo a criança ou a mãe que amamenta precisam excluir proteínas do leite de vaca de sua dieta. Mesmo com a possibilidade de cura, o Dr. Júlio Cezar Boaventura endossa ser necessário o acompanhamento médico contínuo para avaliar o melhor momento de testar a reintrodução da proteína.

Cuidados durante o tratamento
Durante o tratamento, o médico afirma ser importante manter uma vigilância rigorosa com a alimentação, tanto em casa quanto em ambientes externos. “Outro cuidado importante é nunca fazer a reintrodução da proteína do leite sem supervisão médica. Isso pode causar reações graves e comprometer o tratamento”, alerta o Dr. Júlio Cezar Boaventura.
O profissional destaca que os pais precisam se atentar a:
- Ler atentamente os rótulos dos alimentos industrializados;
- Evitar o contato com leite e derivados, mesmo em pequenas quantidades;
- Manter acompanhamento regular com o pediatra ou alergista;
- Não suspender alimentos por conta própria, sem orientação médica;
- Evitar dietas restritivas sem necessidade, especialmente para mães que amamentam.
“O ideal é sempre procurar um profissional de saúde diante de qualquer sinal de que algo não está bem. Com diagnóstico precoce e acompanhamento adequado, é possível garantir um crescimento saudável e tranquilo para a criança”, finaliza o Dr. Júlio Cezar Boaventura.
Por Nayara Campos