
A exploração dos minerais estratégicos e críticos pode ser uma alavanca para o desenvolvimento do país, uma vez que há abundância no subsolo nacional, no entanto, o diálogo entre as instituições do setor ainda é precário, e é preciso ampliar o debate e buscar abordagem mais complexa. As oportunidades são expressivas nesse cenário de avanço da agenda global de transição energética. Estimativas para a demanda global dessas commodities pode chegar a US$ 1 trilhão até 2030, de acordo com especialistas.
Ontem, no primeiro painel do evento CB Talks: Os desafios da agenda de minerais estratégicos para o Brasil, a diretora do Instituto Escolhas, Larissa Rodrigues, lembrou que a área de mineração — que tem imagem "muito negativa" perante a sociedade — enfrenta desafios de encontrar um equilíbrio entre "desenvolver projetos importantes à economia e ter contenção dos impactos ambientais e sociais". "No Brasil, partimos de um histórico muito negativo e um legado ambiental e social muito ruim no setor de mineração, o que precisa ser falado e não pode ser ignorado. A discussão de vários assuntos atrelados à responsabilidade é importante para construir o setor passo a passo olhando para o futuro, em uma base sólida de responsabilidade", afirmou ela, no evento realizado pelo Correio Braziliense, com apoio do Instituto Escolhas.
Apesar dos desafios que o setor minerador ainda precisa enfrentar, a diretora do Escolhas se disse otimista. "Há espaço para diálogo (entre a universidade e o mercado de minério), além disso, a gente precisa desse diálogo", disse. Para a especialista, é crucial ter essas discussões porque, embora haja um consenso sobre a importância da responsabilidade, existe um descolamento entre o discurso e a prática. "O debate é, portanto, não apenas importante, mas essencial para que o setor mineral brasileiro possa construir um futuro mais responsável, seguro e estratégico, superando seu passado e respondendo às demandas globais e nacionais", adicionou.
Responsabilidade
Rodrigues reforçou que é necessário o alinhamento entre a exploração mineral e a responsabilidade socioambiental. "Ao lado da discussão dos investimentos, ao lado da discussão dos preços dos minerais, as responsabilidades ambiental e social estão sempre lá e devem ser discutidas. Esse é um tema central no mundo e aqui no Brasil também", orientou. Ela destacou que as universidades, os centros de pesquisa e as empresas possuem um papel importante no desafio de otimizar o setor mineral, pois são responsáveis pela "produção de conhecimento, qualificação" e pela formação das pessoas que atuam no setor.
"A melhor forma de tratar o tema é 'encarar de frente', reconhecendo os problemas existentes e buscando resolvê-los", declarou a pesquisadora. "Em um ambiente de conflito e falta de confiança, é difícil resolver os problemas, e a discussão se torna improdutiva, levando a uma insegurança ambiental, social, de investimento e jurídica", reforçou.
Na visão de Larissa Rodrigues, discutir instrumentos específicos para trazer mais segurança e responsabilidade ao setor é algo urgente e, nesse sentido, um exemplo para a abordagem são as garantias financeiras para recuperar áreas degradadas e evitar minas abandonadas. Segundo ela, ações como essa têm uma regulação em países como Estados Unidos, Canadá, África do Sul, Chile e Peru, há décadas. Mas, no Brasil, ainda gera debate.
Janela de oportunidade
Ricardo Sennes, diretor-executivo da Prospectiva Public Affairs Lat.Am, ressaltou que o Brasil tem uma grande janela de oportunidade para avançar na exploração desse mercado potencial que está sendo criado em torno da forte demanda por minerais estratégicos e críticos. "Nós estamos falando quase de um pré-sal, um outro pré-sal", disse.
O executivo defendeu que a exploração depende de um tripé, com regulação previsível, viabilidade econômica e diplomacia. "Qualquer setor está funcionando de maneira dinâmica e equilibrada, de maneira positiva, tem que ter um marco regulatório sólido", destacou.
Sobre a questão da viabilidade econômica, o diretor afirmou que a questão vai além da necessidade de crédito, ao destacar a carteira que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem destinado para infraestrutura. Segundo ele, é preciso trazer a ponta dessa inovação para a questão dos minerais críticos.
"Não basta só olhar para o BNDES e falar que precisamos de crédito. Não é só crédito. Às vezes é mais garantia do que crédito. Às vezes é um investimento mais focado num tema crítico de inovação, do que necessariamente crédito", disse.
Em relação aos desafios envolvendo a geopolítica, Sennes destacou que a negociação de minerais estratégicos passa por questões sensíveis e tem componentes diferenciados no mercado internacional. "Não é só a questão da transição energética, nós estamos falando de toda a cadeia de eletrônicos, de toda computação de alta velocidade, estamos falando de toda rede de comunicação. Inteligência artificial depende disso, estamos falando de uma indústria sensível. A indústria bélica tem muito a ver com isso também", mencionou.
O executivo ainda lembrou que o tema engloba uma "uma diplomacia estratégica que não é comum". "Não vamos vender e conseguir nos inserir nesse mercado de mineral crítico como a gente se insere talvez no mercado de commodities, agrícola, por exemplo. Vai ter que ter acordo de fornecimento, de transmissão, de cooperação tecnológica. São questões que têm muito conflito e a gente vai ter que saber navegar neste conflito."
Acelerando a agenda
Durante o debate, Fernando Azevedo, o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), reforçou que minerais estratégicos são fundamentais para acelerar o desenvolvimento da agenda da transição energética, com impacto na economia.
Ao apresentar que praticamente todos os elementos da tabela periódica estão no subsolo nacional, ele destacou que o Brasil tem potencial de liderar essa agenda mundial, especialmente porque 14 dos 17 minerais estratégicos e críticos que são utilizados para o armazenamento de energia são encontrados no solo brasileiro.
"Nós temos um potencial para liderar globalmente isso. Oportunidade geopolítica e econômica. E temos que tomar cuidado no risco de dependência tecnológica. A tecnologia para isso é muito importante", afirmou.
Plano nacional
Na avaliação de Azevedo, oportunidades e desafios estão claros, como fortalecer a pesquisa, atrair investimento e equilibrar a exploração, a conservação e a soberania. E, nesse sentido, o Plano Nacional de Mineração (PNM) para 2025 está sendo elaborado pelo governo, é um dos incentivos para o desenvolvimento do setor, que precisa avançar no mercado regulatório.
O vice-presidente do Ibram ressaltou que a COP 30, que será realizada no Brasil, representa uma janela geopolítica estratégica para o país. "O mundo estará olhando para a Amazônia. Os minerais críticos da transição energética serão centrais nas discussões climáticas", afirmou. Segundo ele, o instituto vem promovendo diálogos entre o setor público e o privado, e também pretende atuar como uma ponte entre o setor mineral e os compromissos climáticos globais. "A nossa proposta é posicionar o setor como parte da solução climática, e não do problema", disse.
Fernando Azevedo ainda reforçou que o minério é importante não apenas para a segurança energética. "A gente tem segurança energética, segurança alimentar e segurança mineral. A segurança alimentar passa pelo minério", frisou Azevedo.
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Rosana Hessel
RepórterJornalista formada pela Católica (PUC-SP), com especializações em Economia por FGV-SP e IBMEC-SP e com MBA em Finanças pela FIA-USP. Como jornalista, trabalhou por 14 anos na Gazeta Mercantil, desde trainee, passando por várias editorias como repórter