Guerra no Leste Europeu

Rússia desafia os EUA e rejeita ultimato de Trump

Vice-chanceler do presidente Vladimir Putin alerta que Moscou não negociará com Kiev sob ameaça ou pressão e sinalizou a continuação do conflito, depois de Donald Trump conceder um prazo de 50 dias para Moscou assinar um cessar-fogo

Volodymyr Zelensky, presidente ucraniano, rende homenagem a soldados mortos na guerra, durante o Dia da Pátria, em Kiev  -  (crédito: Serviço de Imprensa Presidencial da Ucrânia/AFP)
Volodymyr Zelensky, presidente ucraniano, rende homenagem a soldados mortos na guerra, durante o Dia da Pátria, em Kiev - (crédito: Serviço de Imprensa Presidencial da Ucrânia/AFP)

O prazo de 50 dias, anunciado por Donald Trump, para que a Rússia encerre a guerra contra a Ucrânia, sob pena de sofrer tarifas de até 100% sobre os produtos exportados para os Estados Unidos, levou o Kremlin a adotar uma postura desafiadora. Sergey Ryabkov, vice-ministro das Relações Exteriores russo, declarou que Moscou sempre esteve pronta para negociar com Kiev, mas que não o fará sob ameaças ou ultimatos.

Especialista em EUA e principal negociador nuclear da Rússia, Ryabkov avisou que, se o seu país não conseguir atingir os objetivos por meio da diplomacia, "o conflito continuará". "Somos inabaláveis nesta posição. Gostaríamos que Washington e a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) em geral tratassem esta questão com a máxima seriedade", cobrou. Além da ameaça de tarifaço, a decisão de Trump de abastecer a Ucrânia com armamentos, por meio da Otan, irritou o Kremlin. 

Depois de uma reportagem do jornal Financial Times, segundo a qual Trump teria pedido ao presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, para que aumentasse os ataques dentro do território russo, usando mísseis americanos, a Casa Branca não escondeu o mal-estar. Ao ser questionado por repórteres, o republicano respondeu: "Não, (Kiev) não deveria mirar Moscou". Apesar de afirmar que precisa de "mais tempo" para avaliar o ultimato de Trump, o porta-voz da Presidência da Rússia sinalizou a disposição de prosseguir com a guerra.

Militares ucranianos da Brigada Spartan realizem exercícios de combate e resiliência mental, em Dnipropetrovsk
Militares ucranianos da Brigada Spartan realizem exercícios de combate e resiliência mental, em Dnipropetrovsk (foto: Roman Pilipey/AFP)

Dmitri Peskov disse que "a declaração do presidente Trump é muito séria". "Sem dúvida, precisamos de tempo para analisar o que foi falado em Washington". "Parece que essa decisão tomada em Washington, nos países da Otan e diretamente em Bruxela, será percebida por Kiev não como um sinal em favor da paz, mas para continuar a guerra", alertou o assessor de Vladimir Putin. 

Por sua vez, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, afirmou que gostaria de entender "o que está por trás" do ultimato. "Antes, também havia os prazos de 24 horas e de 100 dias, já vimos de tudo e realmente gostaríamos de entender a motivação do presidente dos EUA", explicou. Lavrov denunciou a "pressão indecente" exercida pela União Europeia e acusou a Otan de apoiar "grosseiramente" as exigências de Zelensky e de continuar a "inundá-lo com armas avançadas, causando danos crescentes aos contribuintes dos países ocidentais".

De acordo com a agência de notícias russa Tass, Lavrov fez pouco caso da ameaça de novas sanções impostas por Washington a Moscou. "O número de sanções anunciadas contra nós é sem precedentes. Estamos lidando com isso, não tenho dúvidas de que lidaremos com isso", comentou. "Temos um ditado: 'Se você cavar um buraco para os outros, você mesmo cairá nele'. As sanções impostas pela União Europeia e as que estão sendo preparadas em Bruxelas, juntamente com as tentativas de arrastar os EUA para esse vórtice de sanções, tudo isso causou danos severos à economia europeia."

Em entrevista por telefone à emissora britânica BBC, Trump disse que não confia "em quase ninguém", ao ser questionado sobre se acreditava em Putin. "Eu estou decepcionado com ele, mas ainda não cansei dele", declarou. O presidente americano ironizou o comportamento de Putin. "Teremos uma ótima conversa. Eu direi: 'Isso é bom, acho que estamos perto de conseguir', e, então, ele derrubará um prédio em Kiev", afirmou. Ontem, as sirenes antiaéreas soaram pelo menos três vezes em Kiev, capital da Ucrânia. Citado pelo tabloide britânico The Sun, o propagandista russo Aleksandr Sladkov recorreu à chantagem nuclear. "Trump tenta nos assustar com mísseis, mas é difícil fazer isso. Trump deveria estar amedrontado. Todo mundo está tentando nos empurrar para transformarmos Kiev e Lviv em Hiroshima e Nagasaki", ameaçou. 

Em publicação na rede social X, Zelensky informou que manteve reuniões com diplomatas ucranianos do Ministério das Relações Exteriores e do gabinete presidencial. Entre os temas abordados, a aceleração do lançamento do Tribunal Especial para os Crimes de Agressão Russa contra a Ucrânia, em respeito ao direito internacional. 

Pouco convincente

Olexiy Haran, professor de política comparada da Universidade de Kiev-Mohyla, afirmou ao Correio que observadores e políticos de alto nível na Europa não veem um discurso convincente de Trump. "Não entendemos o motivo de ele impor um prazo de 50 dias. Agora, a Rússia usará o poder de manobra. O governo de Putin anunciará a disposição em prosseguir com negociações, sob um novo plano de cessar-fogo formulado pela União Europeia. Infelizmente, não houve qualquer decisão em relação a novas sanções", explicou. "Isso torna a Rússia em posição de dizer que não está com medo. O comportamento de Trump não é convincente. Ele decidiu postergar o prazo de uma semana, para duas e, então, para 50 dias. Putin continuará a fazer o que desejar e dirá que não há razão para ampliar as sanções, ao sentir a hesitação do norte-americano."

Para Haran, é preciso ver como será implementada a entrega de equipamentos militares e de sistemas de defesa antimísseis Patriot. Na segunda-feira, Trump anunciou que os EUA venderão as baterias antiaéreas Patriot para a Organização do Tratado do Atlântico (Otan), e a aliança militar ocidental terá a incumbência de repassá-las à Ucrânia. "Há frustração do lado ucraniano, não por causa das declarações da Rússia, mas por conta da hesitação de Trump em tomar ações decisivas e pressionar Moscou", acrescentou. 

China promete mais apoio a Moscou

O presidente da China, Xi Jinping (D), declarou ao chanceler russo, Sergey Lavrov (E), que os dois países devem "reforçar seu apoio mútuo", informaram as agências estatais, depois da reunião entre ambos organizada à margem de um encontro ministerial da Organização de Cooperação de Xangai. Xi afirmou que China e Rússia devem "colocar em prática o importante consenso" alcançado com o presidente russo, Vladimir Putin, e "reforçar seu apoio mútuo em fóruns multilaterais", segundo a agência oficial de notícias chinesa Xinhua. Pequim e Moscou devem "unir os países do Sul Global e promover o desenvolvimento da ordem internacional em uma direção mais justa e mais razoável", afirmou Xi, segundo a Xinhua.

Ucranianos saúdam a "Agente Melania"

 Uma declaração de Donald Trump sobre a esposa, Melania Trump, foi o bastante para que ucranianos apelidassem a primeira-dama de "Agente Melania Trumpenko" e celebrassem o que seria uma influência na visão do marido em relação à Rússia. "Minhas conversas com ele (Putin) são sempre agradáveis. Eu digo, não é uma conversa adorável? E, então, os mísseis explodem naquela noite", disse Trump, ao se reunir, na segunda-feira, com Mark Rutte, secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). "Eu vou para casa, e digo à primeira-dama: 'Eu conversei com Vladimir hoje. Tivemos uma conversa maravilhosa'. Ela disse: 'Sério? Outra cidade acaba de ser atacada'", acrescentou o presidente americano. 

 

 

postado em 16/07/2025 05:50
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