
Um grupo de pesquisadores da Universidade de Osaka, no Japão, desenvolveu um medicamento capaz de inibir uma proteína envolvida na morte celular, impedindo que o acidente vascular cerebral (AVC) agudo cause danos significativos. Com essa fórmula, os cientistas acreditam ser possível prevenir a destruição dos neurônios no cérebro. A medicação é baseada na proteína multifuncional GAPDH (gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase) e está associada à patogênese de muitas doenças cerebrais intratáveis e do sistema nervoso. Os resultados do estudo foram publicados na revista iScience. Médicos ouvidos pelo Correio estão confiantes no avanço do estudo que, por enquanto, foi testado em camundongos.
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A equipe japonesa desenvolveu o GAI-17, um inibidor da agregação de GAPDH. Quando este inibidor foi administrado em camundongos modelo com AVC agudo, seis horas após o acidente, houve um nível significativamente menor de morte e paralisia de células cerebrais em comparação com camundongos não tratados. O GAI-17 também não apresentou efeitos colaterais preocupantes, como efeitos adversos no coração ou no sistema cerebrovascular.
Para Eduardo Waihrich, PhD, neurocirurgião vascular e head da neurocirurgia vascular na rede Kora Brasília e no hospital Sírio Libanês em Brasília, as perspectivas são positivas. "O estudo ainda está em fase com animais e precisamos iniciar, de forma bem segura, a reposta em seres humanos. Tudo parece muito promissor, estamos otimistas com a mediação, mas ainda há muito a fazer para colocarmos a medicação de forma segura em nossa prática."
Melhoras
Os experimentos com GAI-17 mostraram melhoras nos camundongos, mesmo quando administrado seis horas após o AVC. "Espera-se que o inibidor de agregação de GAPDH que desenvolvemos seja um único medicamento capaz de tratar muitas doenças neurológicas intratáveis, incluindo a doença de Alzheimer", afirmou o professor Hidemitsu Nakajima, da Escola de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da Universidade Metropolitana de Osaka, que liderou a pesquisa. "No futuro, verificaremos a eficácia dessa abordagem em modelos de doenças além do AVC e promoveremos mais pesquisas práticas em direção à construção de uma sociedade saudável e longeva."
Com ampla experiência no tratamento de pacientes com AVC, Siane Prado, coordenadora da equipe de neurologia do Hospital Brasília Águas Claras, da Rede Américas, disse que o desafio é obter resultados também com seres humanos. "O principal desafio é a transposição dos achados do modelo animal para seres humanos, que envolve múltiplas etapas: estudos de toxicidade, farmacocinética, biodisponibilidade, interação com outros fármacos, e claro, eficácia clínica em diferentes perfis de pacientes. É necessário confirmar que o GAI-17 consegue atravessar a barreira hematoencefálica com segurança e atingir níveis terapêuticos no tecido cerebral humano. O histórico da neuroproteção no AVC é repleto de tentativas promissoras que falharam em fases clínicas, por isso é essencial que esses próximos passos sejam conduzidos com rigor científico e validação multicêntrica."
Para Waihrich, os testes com humanos também serão promissores. "Fico muito feliz com publicações geniais e sérias com essa. Um frescor de esperança na luta contra o AVC", ressaltou. Para Siane Prado, as perspectivas são uma luz nos tratamentos, abrindo possibilidades de ampliar as alterantivas oferecidas.
"A ideia de atuar diretamente na cascata de morte celular, e não apenas na reperfusão, abre uma nova frente terapêutica no AVC — especialmente para pacientes que chegam fora da janela para trombólise ou trombectomia. Os resultados mostram efeito neuroprotetor mesmo com administração tardia (até 6 horas após o AVC), o que pode ter grande impacto em contextos onde o acesso rápido ao sistema de saúde ainda é limitado", disse.
Duas perguntas para Eduardo Waihrich, PhD, neurocirurgião vascular, head da neurocirurgia vascular na rede Kora Brasília e no hospital Sírio Libanês em Brasília
O senhor vê com otimismo essa pesquisa sobre o inibidor de agregação de proteínas que mostra níveis mais baixos de morte celular e paralisia em camundongos com AVC agudo?
Atualmente, a principal ferramenta para tratamento do AVC isquêmico na fase aguda são as terapias reperfusionais, ou seja, reestabelecer o fluxo sanguíneo na artéria ocluida o mais rápidos possível até um determinado limite tempo. Muitas vezes, há casos que conseguimos realizar o atendimento em intervalo ótimo, com uma excelente taxa de reperfusão e mesmo assim não temos uma adequada resposta neurológica, com uma área de lesão cerebral significativa. Definitivamente, novos fármacos que possam auxiliar o resultado final de nossas intervenções atuais, seja diminuindo a área cerebral lesionada definitivamente ou mantendo mais áreas cerebrais passíveis de recuperação pós reperfusão seriam de auxílio monumental para o bom resultados a esses pacientes.
Quando o senhor se depara com pesquisas assim, qual sua primeira reação?
Sempre defendi que não se faz medicina de vanguarda se não estiver em conjunto trabalhando com a ciência médica, por isso, além de minha formação cirúrgica, realizei minha formação acadêmica completa (mestrado e doutorado). Não vejo como possamos dar os próximos passos no cuidado dos pacientes e melhorar os resultados de nossas intervenções sem a pesquisa científica médica de ponta. Estudos como esse abrem a janela de que, num período de curto e médio prazo, possamos otimizar sobremaneira os resultados de terapêuticas que estamos fazendo agora.
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Eduardo Waihrich, PhD, neurocirurgião vascular, head da neurocirurgia vascular na rede Kora Brasília e no hospital Sírio Libanês em Brasília
O senhor vê com otimismo essa pesquisa sobre o inibidor de agregação de proteínas mostra níveis mais baixos de morte celular e paralisia em camundongos com AVC agudo?
Atualmente, a principal ferramenta para tratamento do AVC isquêmico na fase aguda são as terapias reperfusionais, ou seja, reestabelecer o fluxo sanguíneo na artéria ocluida o mais rápidos possível até um determinado limite tempo. Muitas vezes, há casos que conseguimos realizar o atendimento em intervalo ótimo, com uma excelente taxa de reperfusão e mesmo assim não temos uma adequada resposta neurológica, com uma área de lesão cerebral significativa. Definitivamente, novos fármacos que possam auxiliar o resultado final de nossas intervenções atuais, seja diminuindo a área cerebral lesionada definitivamente ou mantendo mais áreas cerebrais passíveis de recuperação pós reperfusão seriam de auxílio monumental para o bom resultados a esses pacientes.
Quando o senhor se depara com pesquisas assim, qual sua primeira reação?
Sempre defendi que não se faz medicina de vanguarda se não estiver em conjunto trabalhando com a ciência médica, por isso, além de minha formação cirúrgica, realizei minha formação acadêmica completa (mestrado e doutorado). Não vejo como possamos dar os próximos passos no cuidado dos pacientes e melhorar os resultados de nossas intervenções sem a pesquisa científica médica de ponta. Estudos como esse abrem a janela de que, num período de curto e médio prazo, possamos otimizar sobremaneira os resultados de terapêuticas que estamos fazendo agora.